Entrevista com Mario Laffitte, vice-presidente de marketing e assuntos corporativos da Samsung na América Latina
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UOL – Quais os desafios de uma empresa de tecnologia no Brasil?
Mario Laffitte – A área de pesquisa e desenvolvimento (P&D) no Brasil é avançada. Temos um sistema fiscal e tributário que atraiu indústrias eletroeletrônicas para o país e que manda as companhias que operam aqui fazer investimento em P&D.
Para nós, os produtos que saem das fábricas brasileiras têm o mesmo nível de qualidade de qualquer outra fábrica, seja ela na Coreia do Sul, na China, nos Estados Unidos ou no Vietnã.
Nossos pesquisadores também têm o mesmo nível de formação que outros pesquisadores em outros locais do mundo. Aliás, há até um certo intercâmbio de pesquisadores.
Entrando nos desafios que encontramos aqui, é claro que o número de PhDs [profissionais especializados, com doutorado] não é tão grande quanto em outros países. Se tivéssemos um número maior de PhDs., esse é um tema que poderia gerar muito mais frutos para a Samsung e para o país.
Além da escassez de mão de obra qualificada, há algum outro entrave?
Há uma série de outras questões que poderiam ser aprimoradas no ambiente de negócios da América Latina, para melhorar a competitividade da nossa região. Posso citar logística, eficiência na execução de negócios, questões burocráticas e simplificações tributárias que seriam bem-vindas para fomentar o crescimento dos negócios. Não apenas para a indústria de tecnologia, mas para todas.
Com a crise no Brasil afetou o negócio da Samsung?
Não há dúvida de que o cenário global, com o fim do superciclo das commodities [matérias-primas], afetou muito as economias latino-americanas. No Brasil, nós temos questões circunstanciais mais contundentes. Afinal de contas, se você olha os números, nós passamos por dois anos que representam a maior queda do PIB, se não da história, de um bom período.
O que você faz em ciclos mais desafiadores? Você faz um planejamento com mais cautela, que possa prever alguma redução de mercado, em que a gente possa minimizar as consequências tanto para o consumidor quanto para as nossas operações. Da mesma forma, quando vemos os ciclos voltando a apontar crescimento, também precisamos nos planejar para poder colher os frutos desse crescimento.
A questão é: crises acontecem, sejam cíclicas ou circunstanciais. As cíclicas são mais simples de você antever, pois há sinais, e você faz um planejamento. As circunstanciais são mais agudas, e é obvio que geram necessidade de mais agilidade, mais rapidez no planejamento estratégico para passar por esse momento. As crises agudas [circunstanciais], em geral, são mais curtas. As cíclicas são um pouco mais longas. Então, você tem que ter a gestão do seu negócio levando em consideração esses aspectos. Foi o que nós fizemos na América Latina, e é um dos motivos pelos quais tivemos dois bons anos.
A crise econômica e os casos de corrupção assustam as grandes empresas?
Sem dúvida. Qualquer complexidade do ambiente de negócios, em qualquer país que seja, gera um maior pensamento antes de você executar qualquer investimento. Isso vale tanto para o capital local quanto para o estrangeiro.
Empresas que já estão nos mercados latino-americanos têm um conforto de entender essa complexidade. Como estamos na região há muitos anos, temos uma capacidade de entendimento das circunstâncias econômicas e de desenvolvimento dos negócios nessa região. Isso gera um pouco mais de know-how [experiência] para a empresa. Mas complexidades nunca são atraentes para investidores. Investidores gostam de simplicidade, clareza e transparência.
No governo atual, do presidente Michel Temer, houve alguma mudança no ambiente de negócios?
No período mais recente, foi muito benéfica para os negócios a redução da taxa de juros a níveis bastante baixos, historicamente falando. Óbvio que isso é uma alavanca para o consumo. Com juros menores, o custo do capital é menor, e o parcelamento fica mais barato para o consumidor. E você também fomenta uma cadeia paralela à cadeia de eletroeletrônicos, que é a cadeia de mobiliário, de novas casas, de novos eletrodomésticos. Tudo isso gera um ciclo virtuoso de crescimento da economia.
E com relação às reformas promovidas pelo governo?
As reformas são interessantes no sentido de gerar um ambiente de mais confiança do investidor e do consumidor. O varejo é muito baseado em confiança. O investidor não coloca seu capital no negócio se não tiver confiança no futuro, e o consumidor, se não tem confiança no seu emprego e na manutenção da sua renda e do seu poder aquisitivo, não compra. Então, as reformas têm um componente positivo, por gerar um ambiente de mais confiança em longo prazo no cenário econômico brasileiro.
O que o senhor proporia para melhorar o Brasil?
Como brasileiro, sou otimista e vejo um futuro melhor para nosso país. [Um futuro] em que a gente tenha um sistema mais transparente, em que a gente consiga ter uma cultura mais ética e que gere um mundo político mais alinhado com as ansiedades e expectativas da sociedade.
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